ANTES A REVOLTA COM MEDO....DO QUE O MEDO DA REVOLTA....victor serra
FRANCISCO FERRER


Biografia

Ferrer nasceu em Alella (Barcelona) em 10 de janeiro de 1859. Ele pertencia a uma família de pequenos proprietários, católica e monarquista. Por razões familiares, ele se mudou para Barcelona e passou a trabalhar com um comerciante de farinha Provençals Sant Martí. No entanto, quinze anos de idade, quando o comerciante matriculados em cursos noturnos, a partir dos ideais republicanos. Durante a Primeira República, Francisco Ferrer entusiasticamente participaram em experiências de educação popular. Durante os anos seguintes a auto jovem autodidata estudado minuciosamente as idéias de Pi y Maragall e conheceu as doutrinas dos internacionalistas. A avant-garde do seu ensino irá causar inimizade do poder do Estado e os sectores mais retrógrados da Igreja. Seu sonho de trazer o projeto para a frente será punido com a morte. Acusado de ser o líder da revolta popular que estava a ter lugar em Barcelona, conhecida como "Semana trágica" é filmado em 1909 em Montjuic, após uma corte marcial. Na Espanha e outros países, são levantados os protestos contra a execução, pedindo a revisão da sentença e causar a queda de Antonio Maura e seu governo. Um ano depois, o Congresso dos Deputados reconheceu a sua inocência. Através de imagens de arquivo e tiro, reconstrói a vida de Francisco Ferrer Guardia, ideológica e os seus caprichos e vicissitudes que teve de enfrentar na realização do seu trabalho."

A morte de Ferrer e a imprensa setubalense.
Por : CARLOS MOURO     (Artigo Inédito )

O carácter local, bem como a periodicidade semanal dos periódicos compulsados – Independente, O Elmano e Germinal – impedia-os de seguirem o palpitar diário da vida internacional. Para tanto circulavam inúmeros títulos nacionais. Quotidianamente, estes traziam a todos as mais desvairadas imagens do horror que se vivia nas ruas de Barcelona. Talvez por isto a generalidade da imprensa sadina (conhecida) não se mostrou sensível aos sucessos da capital catalã, em Julho de 1909 (espelhando igual atitude dos setubalenses?). Porém, o fuzilamento de Francisco Ferrer calou fundo no espírito dos periodistas locais e, por certo, no ânimo dos respectivos leitores. A reacção dos periódicos sadinos variou, compreensivelmente, em função do posicionamento político dos respectivos corpos redactoriais.
Assim, o Independente – que, à época da “semana sangrenta”, era editado por Luís Augusto e tendo como redactor Miguel Ângelo Silva Soares, genro do industrial e proprietário António José Baptista (1854-1912), poderoso influente local e autarca, último abencerragem, na cidade, do poder real e que, após 16 de Junho de 1910, se subintitularia “semanário monárquico” – em nome de valores piedosos e profundamente católicos, lá foi lamentando a morte de Ferrer, do mesmo modo que condenava as outras mortes ocorridas nas ruas da Catalunha. Desaprovava a política antimilitarista (“utopismo demasiado louco (…), crime de lesa nacionalidade”); lastimava a perturbação da ordem, a quebra da honra nacional de um país, a que conduzira um “sentimentalismo piegas e balofo”, por “arremetidas revolucionárias”. Os “nefastos propagandistas” (os anarquistas e os republicanos eram, para o citado periódico, a mesma coisa) haviam desorientado os “obreiros do progresso” que, em Barcelona, “serviram de alvo às mausers, numa hecatombe horripilante”. Essa “propaganda dissolvente” fizera acreditar que na destruição de tudo quanto representava a “ordem social” se encontraria “o bem-estar, a felicidade e a riqueza”. Reprovando a violência, ciente de que um crime não pode a sociedade puni-lo com crime igual, o Independente lá foi defendendo a repressão governativa pela força e estranhando a defesa exclusiva que se fazia de Ferrer. Não percebendo como era possível que “os nossos republicanos e anarquistas” calassem esse facto, interrogava-se: “porque se faz todo este barulho em volta da individualidade do fundador da Escola Moderna, e se esquecem todas as demais vítimas dos acontecimentos da Catalunha?”.
Diversa era a posição d’O Elmano – “semanário político, literário e noticioso” que alinhava (desde 1895, pelo menos) com os republicanos, tendo a dirigi-lo Leonardo Duarte Júnior (1859-1915), um destacado pioneiro local do novo ideário. Para O Elmano – seguindo, aliás, o que se escrevera nas páginas do Diário Popular – o crime que se perpetrara nas masmorras do castelo de Montjuich, nesse 13 de Outubro, pouca importância tinha, se comparado com o enorme atentado social e civilizador que se praticara. Revelando os traços anticlericais tão queridos aos republicanos, escreveu-se: “A Espanha católica, que ainda há dois dias, em Melilla, dançava e cantava em honra da Virgen del Pilar, fuzilou Ferrer, uma intelectualidade e um carácter”. Segundo o ponto de vista d’O Elmano, aquele pedagogo não devia ter sido fuzilado porque “era uma inteligência e na espécie humana as inteligências poupam-se como os diamantes e as pérolas” e “porque o seu processo foi iníquo e monstruoso e o mundo civilizado intercedia por ele”. A 30 de Outubro, em artigo firmado por Fazenda Júnior – “Melilla e Montjuich” – escreveu-se que o fuzilamento de Ferrer “desonrou para sempre a Espanha negra de Torquemada, de la Cierva e de Maura”, associando, deste modo, o nome do inquisidor-geral da Península Ibérica – Tomás de Torquemada (1420-1498), ligado ao horror do Santo Ofício e ao mais cruel obscurantismo religioso – aos governantes da Espanha de então, nomeadamente a António Maura y Montaner (1853-1925). O Elmano atribuía aos “reaccionários mitrados” a verdadeira responsabilidade pelo assassinato. Maura e os seus não passavam, na óptica de Leonardo Duarte Júnior, de “simples instrumentos dos ódios ultramontanos”. A conclusão surgia, crua: “aquele país, dominado ignominiosamente pela reacção clerical e jesuítica, não mais se levantará”.
O Germinal – “defensor dos oprimidos”, conotado com o ideário anarquista, publicado aos sábados sob a direcção do professor do ensino livre e, depois, solicitador Martins dos Santos (?-1951), – foi o periódico que mais violentamente protestou pela prisão e subsequente execução do educador espanhol. Uma vez “consumado o atentado liberticida contra Ferrer”, a 5 de Setembro, o Germinal lembrou que “a Espanha reaccionária de há muito acalentava a doce esperança de inutilizar o fervoroso apóstolo da educação livre”. Aquando da revolta de Barcelona, aquele era quem “mais fundo cortava nos interesses e na estabilidade da burguesia dominante”. O Governo espanhol – “representante e fiel intérprete dos baixos sentimentos dessa burguesia odiada” – não hesitou. Apesar de todos os protestos Ferrer seria fuzilado, a 13 de Outubro de 1909. Três dias depois o periódico de Martins dos Santos, empregando a violência verbal que sempre o caracterizara e caracterizaria, titulou, a toda a primeira página: “Um crime monstruoso”. A introduzir a funesta notícia, a cinco colunas, lia-se: “A Espanha burguesa, militar e clerical acaba de cometer contra Ferrer o mais monstruoso crime do século XX”.

Setúbal e os Setubalenses condenaram o fuzilamento de Ferrer.

Em Setúbal, a 24 de Outubro de 1909, no Casino Setubalense, teve lugar uma sessão de homenagem a Ferrer, convocada por diversas associações de classe (soldadores, caixeiros, construtores civis, corticeiros, trabalhadores das fábricas, marítimos, sapateiros e construtores navais) pela Liga Cosercial, pelos centros Republicano e de Propaganda Liberal, pela Escola Liberal e, ainda, pelo periódico Germinal e pelos representantes de O Século, Luta, Mundo e Diário de Notícias.
Segundo o Germinal “a cidade de Setúbal, cujos sentimentos liberais são indiscutíveis e muito antigos e que sentiu a morte violenta do fervoroso propagandista do ensino racional como se sente a morte dum bom amigo ou bom irmão, longe de obedecer a qualquer intuito político-partidário mas só pela consciência dos seus deveres de solidariedade humana, principia a manifestar-se amanhã contra o maior crime político, primeiro e último dessa natureza e duma tal crueldade que se pratica neste século”. Apelava a quem fosse “deveras liberal nesta cidade” a quem detestasse “o bando negro dos sotainas carnívoros, causadores do estagnamento moral e material dos povos, com todas as grandes misérias e infortúnios inerentes” a quem fosse “amante da justiça” e tivesse “compreendido que a união é a base e a mais sólida garantia da vitória da ideia sobre o preconceito, da luz da verdade sobre a treva dos espíritos”. Todos estariam, supunha o periódico, “de corpo e ânimo” com os iniciadores da manifestação. Solicitava, ainda, a “todos os habitantes liberais de Setúbal, seus arredores e vilas próximas a esperarem na estação os oradores de Lisboa que devem usar da palavra na referida sessão, para acompanhá-los ao Casino Setubalense”. Não se pretendia “ovacionar indivíduos quaisquer” mas sim “render preito à justiça e desagravar a memória de Ferrer e a consciência universal do insulto que lhes foi infligido pelo Governo espanhol, facinoroso e cobarde”. Pretendia-se uma manifestação silenciosa que não provocasse “as fúrias da autoridade local” o que poderia “prejudicar dalgum modo o bom êxito do empreendimento”.
O Casino encheu. Entre os oradores contavam-se os representantes de alguma imprensa de Lisboa e Martins dos Santos, que representava as agremiações operárias e centros. Este foi indicado para presidir à sessão, tendo declinado em Ezequiel Soveral Rodrigues que era “quem mais de direito, por sua inteligência e serviços prestados ao movimento liberal de Setúbal”. Para secretariar a sessão foram aclamados José da Rocha – delegado da Liga Comercial – e Calçada – delegado do Centro Republicano. O primeiro orador foi Martins dos Santos que, após reiterar o repúdio pelo atentado contra Ferrer e após criticar o Governo espanhol, lembrou que “dentre as terras portuguesas aquela cuja história lhe impunha o dever de acompanhar o grandioso movimento de protesto contra as carnificinas de Espanha, destaca-se Setúbal, justamente considerada pela altiva independência do seu povo, pela admirável coesão do seu operariado – a Barcelona portuguesa”. Seguiu-se Campos Lima – que o Germinal intitulava como “nosso amigo e inteligente camarada” – que protestou contra o fuzilamento de Ferrer e contra o facto de em Montjuich jazerem ainda alguns prisioneiros. Falou da Escola Moderna. Enalteceu-a. A sala vibrou intensamente. Em nome do Centro Republicano de Setúbal falou, depois, Joaquim Brandão (1876-1927) que assim se unia a outros republicanos de todo o país que jamais negavam “o concurso do seu protesto veemente e da sua solidariedade sincera, quando se trata de condenar seja qual for o atentado liberticida, ou de promover seja que obra for de reparação social”.
Uma vez realizado o protesto, o Germinal considerou-o uma “manifestação imponente”. No cais ferroviário, a esperar os oradores, chegaram “numerosos grupos” de tal modo que quando o comboio entrou na estação “já pela gare, salas de espera e no largo fronteiro à estação se distribuíam algumas centenas de indivíduos ali levados apenas pelo convite do Germinal por se não ter podido imprimir um manifesto”. O cortejo que se formou foi engrossando. Por alturas do Quebedo já “o aspecto da multidão era soberbo e verdadeiramente consolador”. Alguns elementos das forças policiais intervieram chegando a efectuar algumas “prisões que não puderam manter, tão fortes foram os protestos que surgiram de todos os lados”. O chefe da polícia – Costa – com a conivência do Administrador do Concelho – “congestionado, apopléctico, acabrunhado por aquela cobardia que todos lhe conhecemos” – mandaram formar a cavalaria em frente do Casino e nas traseiras colocar “toda a polícia disponível”.
O Elmano não deu grande destaque às manifestações de 24 de Outubro, pese embora haver condenado o crime praticado pela Espanha católica, nas masmorras de Montjuch, estribando-se num anticlericalismo tão caro aos republicanos. Apenas na edição de 6 de Novembro, numa pequena nota – com o título “Francisco Ferrer” – inserta no canto inferior direito da primeira página, se pode ler: “Por lapso não nos referimos no último número à conferência organizada pelas associações de classe desta cidade e dedicada à memória de Francisco Ferrer.
“Foi uma manifestação imponentíssima como poucas se têm feito em Setúbal. O sr. dr. Campos Lima, que veio de Lisboa, foi acompanhado desde a estação do caminho-de-ferro até ao Casino Setubalense por muitas centenas de pessoas que davam ‘vivas’ à Liberdade e aplaudiam aquele talentoso advogado.
“No Casino falaram os srs. Martins dos Santos, Joaquim Brandão e dr. Campos Lima, produzindo este um brilhante discurso sobre Ferrer e a sua obra. O ilustre orador foi muito vitoriado e aplaudido pela numerosa assistência que, pela numerosa assistência que, por completo, enchia a vasta sala do Casino Setubalense”.
Por seu turno, o Independente viria a referir-se de forma desdenhosa aos protestos. Na edição de 21 de Outubro lê-se: “O directório republicano apenas há dois ou três dias se manifestou no caso Ferrer, aprovando uma pedantesca moção redigida pelo sr. Teófilo Braga.
“Já era tempo, sabidas as contas, mesmo porque os anarquistas da trama começavam a andar resmungões e desconfiados com os parceiros”.
Na edição seguinte, após haver transcrito, em lugar de honra, um artigo saído no Liberal – intitulado “O protesto do directório do Partido Republicano” – procura amesquinhar a reunião de protesto de 24 de Outubro, promovida, nas suas palavras, pelos “republicanos anarquistas aqui de Setúbal”. De Lisboa tinham vindo, afinal, “poucos oradores e dos mais mal cotados”. Depois, referindo-se ao pioneiro do republicanismo local Joaquim Brandão, escreveu: “O melhor discurso, ainda assim, no género republicano, pronunciou-o aquele famoso Dr. Chouriço, já conhecido em Sesimbra, donde é natural. Ninguém percebeu, mas todos disseram ao ouvi-lo: Ah, menino, que bem que falas!”.
Logo depois, criticando a falta de coerência de alguns dos seus adversários políticos escreveu-se no Independente: “Na mesa estava um secretário que não há muito mandava um filho à comunhão, naturalmente por ódio ao clericalismo. Igualmente, vários patriotas, acratas duma cana só, que tínhamos visto na espera dos oradores, estavam depois, devotadamente recolhidos, vendo passar a procissão que nesse dia teve lugar”.
Carlos Mouro




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Educação e Cultura Libertária
por Edgar Rodrigues
 
Os anarquistas tinham em seus projetos de se educar libertariamente. Para tanto fundaram escolas dentro dos métodos da Escola Moderna de Francisco Ferrer (Espanha), de La Ruche de Sebastião Faure (França), formaram grupos de teatro social, populares, proferiam conferências, publicaram jornais, revistas e opúsculos; deram a seus filhos nomes de anarquistas mundialmente conhecidos, não os batizavam pela igreja, e o sepultamento de seus familiares não tinha a presença do padre, era civil.
Os anarquistas pretendiam testar seus métodos reeducando e desbloqueando as mentes embrutecidas por condicionamentos milenares, aplicados ao longo de muitas gerações humanas,.
Na Espanha, Francisco Ferrer y Guardia por fundar a Escola Moderna em 1901, esteve preso, acusado de autor intelectual do movimento grevista com o qual nada tinha e acabou condenado á morte e fuzilado no Castelo de Montjuich, em Barcelona.
Contrariando os inquisidores espanhóis, as ideias de Ferrer voavam como uma revoada de pássaros invadindo nações, atingindo sorrateiramente as camadas mais evoluídas, intelectuais e operários, tocando-lhes a sensibilidade, penetrando em seus cérebros.
O proletariado português recebeu os ensinamentos de Ferrer com entusiasmo. Pela primeira vez era-lhe apresentado um autêntico hino de Amor e de Paz, em forma de ensino, partindo dos bancos escolares, com explicações como estas: "Não se educa integralmente o homem disciplinando a sua inteligência, esquecendo seus sentimentos e desprezando sua vontade. O homem na unidade do seu funcionamento cerebral, é complexo, tem várias facetas fundamentais, é uma energia que vê, afeto que repele ou recebe, concebendo voluntáriamente e tornando em actos as leis do organismo do homem, que abre um abismo onde precisa existir, uma saudável e bela continuidade. E sem dúvida, elemento favorável ao divórcio entre o pensar e o sentir.
Muitos deles serão, indubitavelmente, potentes em suas faculdades mentais, possuindo riqueza de ideias, até compreendem a orientação real, dentro de um conceito formoso, que prepara a ciência da vida, do indivíduo e dos povos. Mas, com todas as suas desatenções egoístas, e as próprias conveniências dos seus fins... tudo isto mesclado com uma levedura de sentimentos tradicionais, formam uma camada impermeável em volta de seus corações, para que não se infiltrem neles ideias progressistas, e não se convertam num jogo de sentimentos propulsores, imediato determinante da conduta do homem".
Estas ideias fizeram desabar sobre a cabeça de Ferrer todas as maldições da Igreja, todo o rancor da burguesia, todo o ódio de Maura!
Em 1908, em vários pontos de Portugal, funcionavam escolas baseadas nos métodos de Ferrer.
As ideias de Ferrer vieram alertar professores, contagiar estudantes e intelectuais, suscitar discussões e debates. nem todos aceitavam integralmente suas ideias pedagógicas, mas todos foram sacudidos por essa nova aurora! Uns contestavam, outros defendiam os métodos da Escola Moderna. As deformações seculares e os ensinamentos "oficiais" opunham-se á sua total aceitação, mas atingidos e contagiados pelas ideias do professor anarquista, muitos começaram a pedir a renovação do ensino da escola.
Jovens intelectuais, alinharam-se na defesa do ensino renovado e vieram colaborar na imprensa anarquista, Deolinda Lopes Vieira, escrevendo sobre "educação integral". E o Dr. Egas Muniz afirmando: "A Escola Moderna, há-de ser o tipo para que hão-de tender as escolas do futuro".
São ainda da imprensa da primeira década do nosso século, as linhas seguintes: "Inspirada nos princípios da Liga Internacional de Educação Racional de Infância, a que presidiu Ferrer, acaba de formar-se em Lisboa uma associação que se propõe criar e manter uma ou mais escolas em Lisboa e demais pontos do País, com base nos seguintes itens:

1º - Organizar e pôr a funcionar qualquer escola, aula ou simples disciplina, separadamente;
2º - A formar planos de estudo pelo método racional, já para escolas integrais, já para determinadas aulas ou disciplinas;
3º - A indicar ou subministrar a qualquer escola ou indivíduo, professores ensinando pelo referido método, que expliquem em algumas lições durante as horas ordinárias do ensino da respectiva disciplina.
4º - A fornecer cadernos, notas, quadros exemplificativos e orientadores do método racional para os professores seguirem e puderem executar mais facilmente esse método;
5º - A dar quaisquer informações que lhe sejam pedidas acerca do método a seguir numa determinada disciplina;
6º - E, finalmente, tendo em vista que a educação profissional é o melhor factor de desenvolvimento económico dos povos e a fornecer ás associações de classe, sindicatos ou núcleos operários, planos de cursos profissionais de qualquer indústria".

"Secretário Geral, Raul Pires; secretário técnico, José Simões Coelho".
As ideias do pioneiro, do idealizador e fundador da Escola Moderna, afetavam a "segurança do Estado", abalavam as velhas estruturas, punham em "perigo "as mistificações da Igreja e derrubavam a fé! E, baseadas nesses interesses mesquinhos, o governo espanhol chamou seus escribas e ordenou-lhes que encontrassem "meios legais" para matar Francisco Ferrer!
Em Portugal, a exemplo de outros países, a imprensa libertária promoveu a divulgação das ideias de Ferrer e as manifestações de protesto contra os carrascos espanhóis, contra Dom Maura e o governo a quem servia de olhos fechados e ouvidos entupidos!
A VIDA, semanário anarquista do Porto, conclama os portugueses a manifestar-se e sua voz teveeco, foi ouvida, atendida, e de norte a sul do país, o proletariado repudiou a medida vingativa, o gesto mesquinho e reacionário.
Em Setúbal, os anarquistas do Núcleo Propaganda Livre, dirigido pelos militantes Gerônimo Favas, Alexandre das Neves e Luiz Bernardino da Associação dos Marítimos, promovem manifestações públicas, tendo como oradores: Bartolomeu Constantino (pelo Núcleo), Martins dos Santos (pelo Germinal), Fernão Botto Machado, Xavier Correia, Francisco de Souza e o republicano Paulino de Oliveira. Os oradores colocaram em votação publica, moção de repúdio ao governo e ao clero espanhol.
No Porto, a campanha em favor de Ferrer foi iniciada pelos anarquistas, aderindo alguns intelectuais e estudantes.
No comício de 7 de Abril de 1907 falaram os seguintes oradores: Serafim Cardoso Lucena, Jaime Cortesão, Francisco Santos, Campos Lima, Pádua Correia, Amadeu da Silva, Leonardo Coimbra, Mem Vidal, Vasco José Moreira, Diamantino Leite, Deolindo Castro, Maneca Ferreira.
Ao final foi aprovada esta breve moção:
Considerando que o caso Ferrer e Nekeus sintetiza toda a Espanha autoritária e jesuítica;
Considerando que o ato de Nekeus não é senão a revelação dum espírito superior que se coloca fora da lei para se não colocar fora da Humanidade;
Considerando que Ferrer praticou apenas o nefando crime de propagar uma instrução racional e livre, e que todo o processo que lhe movem é só uma instigação dos clericais para inutilizar a Escola Moderna;
Os cidadãos portugueses, reunidos em comício público, protestam contra a inquisição espanhola, saudando nesses dois homens a Espanha consciente e livre".
Para os semeadores do anarquismo, o atraso do trabalhador representava um grande mal. Mal, que principiava na pobreza económica e terminava na pobreza de raciocínio.
Tinha raízes muito profundas, seculares, com efeitos negativos na formação e desenvolvimento das personalidades operárias, no povo humilde em geral, sobre quem recaiam todas as desgraças, inclusivé a de não saber ler.
Atrasados intencionalmente por condicionamentos físicos e psíquicos, tinha dificuldades em perceber as mentiras patronais e eclesiásticas, governamentais e divinas!
Boa parte aceitava com naturalidade a sua própria miséria e sua ignorância.
Partindo dessa calamidade pública, desse atraso mental transformado em praga de efeitos anestésicos, o elemento libertário principiou a fundar escolas livres com vistas a alfabetizar e a despertar o raciocínio do aluno, oferecendo-lhe um Mundo Novo que não podia conhecer, confinado como estava dentro dos estreitos limites das convivências da burguesia reinante.
Neste sentido, o jovem anarquista, Campos Lima, que acabava de formar-se em Direito, após uma visita á Comuna Escolar La Ruche, em Rambonillet, Paris (França), dirigida pelo anarquista Sebastião Faure, funda com alguns professores, um grupo para pôr em prática, na terra lusa, os métodos libertários de ensino. Assim o grupo passou a usar o nome de Escola Livre de Coimbra, e esboçou o plano de educação e solidariedade que foi publicado nos jornais anarquistas da época, baseado nestas premissas:
A Escola Livre, que se destina á educação de crianças pobres, procurará evitar quanto possível os efeitos por que o ensino gratuito é ministrado em Portugal pelo estado. As crianças admitidas pela Escola Livre ficarão inteiramente a cargo do grupo que se propõe criá-las, recebendo gratuitamente não só o ensino como alimentação, vestuário e alojamento, procurando-se sempre por cuidados que as famílias pobres não poderiam ter, evitar o desequilíbrio entre o seu desenvolvimento intelectual e o desenvolvimento físico. Todas as crianças além duma instrução geral, aprenderão pelo menos um dos ofícios que mais estejam de harmonia com as suas aptidões e robustez.". E, concluí: "A Escola Livre, esforçar-se-á por que cada criança fique com um conhecimento o mais completo de si próprio e da vida em geral, habilitando-a a procurar os meios indispensáveis á conservação da existência: despertará em todos os sentimentos de independência e liberdade; desenvolverá entre elas o princípio do auxílio mútuo, base de toda a solidariedade, e não tendo a pretensão de formar sábios, dar-nos por satisfeita e cumpridora da missão, se conseguir formar homens de carácter".
A iniciativa do anarquista Campos Lima é seguida pela jovem professora Ilda Adelina Jorge, que organizara um grupo de professoras e escritoras para fundar a Escola Maternal, cujo plano era "receber as crianças de ambos os sexos desde os três até aos sete anos. As mães ao saírem de manda para as suas ocupações, aí colocarão os seus filhos, onde, a par de uma prática de educação, segundo o sistema Froebel, encontrarão alimento, vestuário e em cada professora, em cada pessoa que a dirija, uma mãe carinhosa. A noite voltarão para suas casas. Ao completarem seis anos, passam as crianças para as aulas anexas ás Escolas Maternais, aprendendo a ler e a escrever pelo método de João de Deus, o imortal amigo dos pequeninos. tendo sete anos, sairão da escola, ficando esta, sempre que possa a protegê-las".
A VIDA lembra que "imensa legião" vê na educação a mais possante alavanca do progresso e regista o Núcleo de Educação Anarquista que acabava de formar-se publicando a "Questão Social" de Campos Lima.
A VIDA - volta e meia trazia á discussão a educação e o ensino visto e analisado pela ótica libertaria.
Em Junho de 1906, artigo da responsabilidade da direção do jornal evoca H. Spencer para dizer com ele: "Seria preciso dizer á criança o menos possível, e fazê-la achar o mais possível".
A escola libertária atravessou dificuldades financeiras, inconstância de apoio, mas assim mesmo deixou marcas inapagáveis neste final da Monarquia.
Ainda no final de 1909, nascia o Grémio de Educação Racional com a participação de Adolfo Lima, Emílio Costa, Afonso Manaças, César porto, António Lima, Simões Coelho, António Evaristo, Araújo Pereira, Delfim Guimarães, Jaime Sabrosa, Jorge Fernandes, Raul Pires, Severino de Carvalho, A. Francisco dos Santos, Bernardo Sá Viana, Bento Faria, Carlos Antunes, Jaime Cortesão, Leonardo Coimbra, Todi Gonçalves, Garibaldi Freire, Lucinda Tavares, cujos estatutos foram publicados na época.
O Grémio tinha como meta maior ajudar na ramificação de Escolas Modernas em Lisboa e arredores, o que levou adiante, apesar das alterações que a República introduziu no ensino a partir de 1910.
A MANHÃ depois de se dirigir Ao Leitor saúda a todos os professores e propagandistas, a todas as associações e publicações periódicas que se interessam, advogam e patrocinam a causa da educação e instrução populares, afirmando a adesão a todas as iniciativas que tenham por fim a completa emancipação intelectual do povo".
E mais, entra no terreno da ortografia que os acadêmicos insistiam em atualizar, simplificar e uniformizar a fim de eliminar o analfabetismo. Neno Vasco começou essa campanha em 1904-1905 em S. Paulo, Brasil, nas páginas de "O AMIGO DO POVO", continuou em "A TERRA LIVRE", 1907-1908, adotando inclusive uma simplificação ortográfica que "A MANHÃ" defenderia em 1909.
Engajada nesta campanha de educação integral, Deolinda Lopes Vieira, escreveu em A MANHÃ: "As questões pedagógicas, pois, merecem e precisam de estudo, de desvelo e do dedicado amor de todos os homens e de todas as mulheres.
Neste imenso oceano de maldade e hipocrisia, de violências e injustiças, de devassidão e de crimes em que a humanidade, a pouco e pouco, se vai submergindo e esforçadamente se debate, a educação da infância será, sem dúvida, a sua única tábua de salvação.
Para que assim aconteça, torna-se indispensável e urgente uma profunda remodelação no ensino: uma revolução na maneira de ensinar presentemente.
A fim de que a educação seja útil e benéfica, é preciso que ela vise conjuntamente o cérebro, o coração e a saúde e vigor físico da criança, isto é, que ela tenda a desenvolver normalmente as suas faculdades físicas, intelectuais e morais".
E concluia: "Eduquemos as novas gerações integral, racional e cientificamente, e uma humanidade nova composta de organismos robustos, de cérebros ilustrados, de corações afetuosos, de caracteres dignos, sucederá a esta humanidade de raquíticos, de egoístas, de seres sem dignidade e sem energia".
Num trabalho paralelo ao das Escolas Livres, os libertários adotavam o Esperanto como sua língua universal, agilizavam o livre pensamento, a formação de ateneus, grupos naturalistas e de teatro social. Por este meio faziam propaganda de suas ideias ao vivo para as famílias proletárias e outros, bem como instruíam, treinavam na arte do diálogo social e ainda conseguiam recursos financeiros para prestar solidariedade humana e publicar jornais, revistas e brochuras anarquistas.
O teatro social começou com os socialistas que não tardaram a deixá-lo de lado na medida em que não rendia dividendos eleitorais.
Ao contrário, os acratas davam-lhe amplo apoio: formaram grupos, escreviam peças e/ou traduziam para encenar e levar aos palcos das associações operárias e aos salões tradicionais.
No emaranhado de escolas dramáticas que se formavam e desapareciam depois da representação de algumas peças, até ao final da Monarquia duas se destacaram: a Sociedade de Teatro Livre e a Escola-Teatro Araújo Pereira. Estas duas agrupações chegaram á "profissionalização" e o último deu até aulas de arte de representar.
Para os libertários, todos os meios honestos eram válidos para fazer de cada indivíduo, um cidadão capaz de usar os braços e o cérebro, autogovernar-se. Proferiam centenas e centenas de conferências e palestras, publicaram opúsculos, jornais, revistas, e "mobilizaram" todos os seus militantes na sementeira anarquista.
Para uma melhor compreensão da coerência dessa tarefa, vamos recuar no tempo e alinhar alguns factos.
A REVOLTA divulgou textos valiosos e A VIDA publicou em folhetim: In Limine; Nem Deus nem Pátria, do brasileiro Benjamim Mota; Anarquia e Comunismo, de C. Malato; Reflexões acerca do Individualismo de A VIDA; Humanitários, de A VIDA; Propaganda e Crítica, de A VIDA; Antes do Momento, de C. Malato; Na Sociedade Anarquista, de A. Vida; No Café, de E. Malatesta; Autoridade e Anarquia, de Eduardo Maio; Os Crimes de Deus, de S. Faure; e O Salariato, de Pedro Kropotkine.
Recebeu ainda Enciclopédia Teatral, Amor e Ouro (teatro social), de Agostinho Guizardi; Os Esmagados (drama social), Rothem; A Humanidade, os jornais ANTORCHA (Argentina), DESPERTAR, A OBRA, O CONSTRUTOR CIVIL, a revista de TRABAJO, e os Boletins da Escola Moderna.
Esta imprensa revolucionária produziu a figura do autodidata, militante consciente e culto que tinha em sua moradia (quando a polícia não os levava, nas constantes buscas) obras dos grandes escritores liberais, livres pensadores, filósofos e anarquistas como: A Conquista do Pão, de P. Kropotkine; Um Século de Espectativa, P. Kropotkine; Evolução, Revolução e Ideal Anarquista, Elisée Reclus; A Sociedade Futura, Jean Grave; A Psicologia do Militar Profissional, Y. Prat; Porque Somos Anarquistas, S. F. Merline; Minha Defesa, Etievant; Entre Camponeses, E. Malatesta; Escravidão Antiga e Moderna, E. Areña; O Trabalho, E. Zola; Germinal, E. Zola; Judeus Cristãos e Maometanos, Felizardo Lima; A Religião ao Alcance de Todos, Ibarreta; Da Responsabilidade Campos Lima; Anarquismo e Comunismo, C. Cafiero; Os Crimes de Deus, S. Faure; Evangelho de um Seminarista, Tomás da Fonseca; O Cristianismo e a Razão, Py y Margal; Peste Religiosa, J. Most; Anarquia, E. Malatesta; Pátria e Internacionalismo, A. Hamon; Determinismo e Responsabilidade, A. Hamon; Educação e Autoridade Paternal, Gerard; Na Sociedade Anarquista, Federico Urales; Humanidade del Porvenir, Henrique Liuria; Boletins da Escola Moderna; O Auxílio Mútuo, P. Kropotkine; Em Volta de Uma Vida, P. Kropotkine; A Propriedade do Socialismo, C. de L.; Um Século de Expectativa, P. Kropotkine; Anarquia e a Igreja, E. Reclus; A Velhice do Padre Eterno, Guerra Junqueiro; Os Sermões da Montanha e Fátima, Tomás da Fonseca e obras de Oliveira Martins, Alexandre Herculano, Heliodoro Salgado, Gomes Leal, Victor Hugo, José Ingenieres, Eugen Relgis, George Nicolai, Bertand Russel, Darwin, E. Heckel e trocava conhecimentos com companheiros do Brasil, da Espanha, da França, da Itália, da Argentina, da Rússia da Inglaterra, dos Estados Unidos, da Alemanha, do Uruguai, do Japão e da Bélgica.

Extraído do livro "AN-ARQUIA: Uma visão da história do movimento libertário em portugal"



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